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NODO DE FALAR REVELA PRECONCEITO


Uma discussão importante é a que trata da "atitude lingüística" entre brasileiros, no que se refere aos africanos escravizados. Por exemplo: "Os escravos vieram para o Brasil" - é errôneo, visto que os escravos foram trazidos e não vieram. Outra visão eurocêntrica: "O africano, em África, geralmente é poliglota" - mas, ao contrário do que muitos devem ter pensado ao ler, eles não falam francês, inglês e alemão; mas sim várias línguas locais. Outro: negros africanos - nem todo africano é negro. Muitas expressões, mesmo sem a consciência dos falantes, acabam refletindo uma visão colonialista. Para se ter uma idéia, a língua portuguesa foi ensinada em escolas fundadas no Benin e em Lagos, na Nigéria, nas primeiras décadas do século XIX, por agudás - africanos descendentes retornados do Brasil. Um século depois (1961), por iniciativa do Centro de Estudos Afro-Orientais (Ceao/Ufba), o português passa a ser ensinado nas universidades de Dacar, Senegal e Ile-Ife (Nigéria), sob a responsabilidade de professores brasileiros.
No Brasil, entretanto, a resistência acadêmica não aceita a interferência de línguas africanas no português, "um produto de ideologias discriminatórias que marcam ainda as atitudes lingüísticas entre nós, contribuindo para a estigmatização dessas línguas, assim como a inferiorização dos seus falantes", observa a etnolingüista cujos estudos em África e Brasil ultrapassam 40 anos.
O curso de pós-graduação oferecido pela Uneb, "História e Cultura Afro-Brasileira", coordenado por Yeda Castro, visa mudar essa percepção. Existe para cumprir a Lei n°10.639, de 09/01/2003, sancionada pelo presidente Lula, a qual estabelece a inclusão, no currículo oficial da rede de ensino, a obrigatoriedade do tema.
O objetivo é capacitar professores dos ensinos fundamental e médio para a releitura das contribuições culturais negro-africanas como parte da constituição da identidade brasileira. A iniciativa é boa, mas não é nova na Bahia. Nos anos 80, o então secretário de Educação do Estado, Edivaldo Boaventura, baixou portaria introduzindo o curso de Estudos Africanos nas escolas. Não vingou por falta de recursos.

SOM E FALA
"Os elementos mais bem preservados que permitem estabelecer as diferenças entre as nações são, sem dúvida, a língua e a música", aponta o etnomusicólogo francês Xavier Vatin, radicado na Bahia há 12 anos. Vatin veio a Salvador e ficou em casa de Pierre Verger, como se sabe, estudioso dos candomblés de cultura iorubá, cujo panteão de deuses é formado pelos orixás (Iemanjá, Oxum, Iansã, Oxóssi...). Desde 99, porém, o francês voltou seus estudos para os candomblés de origem banto.
Para ele, língua e música podem ajudar, hoje, a desmistificar a idéia de uma África única. Isso porque, de acordo com o toque dos instrumentos usados nos candomblés, é possível dizer de que parte da África é originado o som. Ele também observa que as letras das músicas de muitos blocos afros reforçam a África "ideal".
Outro ponto interessante é que, sem dúvida, a música dos candomblés está "mais próxima" do que deve ter sido originalmente africano em relação aos toques dos blocos afros. "Aqui na Bahia, musicalmente há um empobrecimento pela falta de novas influências nos blocos. Salvador é, talvez, um dos lugares do mundo onde há maior diversidade, entretanto, há um fenômeno de fechamento cultural". Para ele, o grande desafio é que essa África mítica parta em busca da África real, contemporânea. (R.B.)

FONTE : Jornal ATarde



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