.·.·'¯`·.·.(¯`·._.·[ EQUINÓCIO DE PRIMAVERA ]·._.·'¯).·.·'¯`·.·. ... :: MITOLOGIAS AGRÁRIAS :: ... A importância atribuída a esta época do ano agrícola tem a ver não só com o renascer da vegetação, vital para povos dela dependentes, mas também com a antiga noção de que o homem teria importante papel na germinação da vegetação. Este papel, no entanto, dependeria do seu estado de “pureza”. A influência que o homem pudesse exercer na germinação e crescimento da vegetação estava sujeita ao seu estado de alma e à submissão aos ditames da moral do grupo. Se tivesse perdido a pureza, teria que tentar recuperá-la, pois desse facto estaria dependente a produção agrária e a sobrevivência dos seus. A recuperação da pureza era conseguida através do sacrifício (oferta), quer individual, quer comunal. Era mesmo entendido que, sem a “purificação”, quer dos indivíduos, quer das comunidades e mesmo dos seus animais, toda a produção agrícola estaria em perigo. Compreende-se assim que um maior número de práticas religiosas tenha ainda lugar neste período de tempo e que as mesmas mantenham o sentido sacrificial da sua função original, no passado. Compreende-se também que uma maior preocupação com o acto religioso tenha maior expressão nas áreas de produção agrícola, mesmo que, como é o caso, na sua maioria, estas tenham sido cristianizadas. Verdade seja dita que, na generalidade, os rituais Cristãos possuem o mesmo sentido, alterando apenas os protagonistas. Devido à complexidade deste período, os ritos a ele ligados obedecem a três diferentes intenções, todas subordinadas à mesma crença, mas empregues em diferentes funções: a) a da preparação do homem para o seu papel de interventor no acto sagrado de fazer germinar a vegetação. Nesta preparação estão incluídos rituais de purificação, traduzidos em sacrifícios (como a morte de um membro importante da comunidade, que mais tarde passa a ser a de um animal). A morte de Cristo, e toda a Semana da Paixão, exemplificam o pensamento da época, sendo que na actualidade, os Romeiros e a Festa de Santo Cristo, em S. Miguel, traduzem as obrigações inerentes a esta função. Outros sacrifícios como tabus alimentares, abstinência sexual, e a análise social, com a respectiva culpabilização pública dos infractores das regras sociais, são também meios de obtenção da pureza. As práticas de análise social e de culpabilização dos infractores estão expressas nos Bailinhos e Danças de Carnaval da Terceira, como importantes reminiscências dessa crença; mas o sentimento de culpa e a necessidade de purificação, enfatizado pela Igreja Católica nesta altura, com a obrigatoriedade da confissão e comunhão Pascal, clarificam o tipo de sentimento considerado próprio da época. b) a intervenção, que consistia na erotização da área e dias correspondentes à germinação das plantas. A prática de ditos e actos obscenos, na vizinhança das plantações, assim como o riso ritual e o desnudamento destinavam-se não só a provocar a luxúria de Zeus (na forma de chuva), mas contribuíam também para um aumento da exaltação individual, com a transferência de energia vital das pessoas para as plantas. As festas carnavalescas atestam as memórias desta prática, quer através do nudismo, quer do riso e do frenesim, criando o clima geral de erotismo, considerado essencial; c) o agradecimento pelo renascer da vegetação e pelo brotar dos frutos. Este agradecimento era parte integrante de um bom relacionamento com a divindade. O aproveitamento dos frutos da Terra (eles próprios também sagrados) só poderia ser legitimado através de um contrato com a divindade. Sem este acordo, poderia ser perigoso ingerir ou aproveitar-se dos frutos. O contrato consiste na oferta de alguns frutos, os primeiros (Primícias) ao Deus, ou em seu nome, aos outros membros da comunidade, antes de alguém ingerir qualquer um destes produtos. As Festas do Espírito Santo, que dominam todo este período nos Açores, exemplificam, com a oferta de grandes quantidades de manjares rituais, este contrato, designado como “Promessa”. São também campo fértil para a investigação de mitologias, visto terem mantido sempre alguma independência em relação à hierarquia católica, investindo na criatividade ou intuição dos praticantes. ........................................................................................................................... Texto de Antonieta Costa - Angra/RJ, Julho de 2004 Referências Bibliográficas - Álvarez de Miranda, Ritos y Juegos del Toro, Madrid, 1962/1998 - Antonieta Costa, O Poder e as Irmandades do Espírito Santo, Edição Rei dos Livros, Lisboa, 1999. - Arnold van Gennep, Manuel de Folklore Français Contemporain, Paris, 1947 - James Frazer, The Golden Bough, a study in magic and religion, Library of Congress, Oxford, Great Britain, 1890/1994 - Mircea Eliade, Tratado de História das Religiões, Edição Cosmos, 1970/1977 - Wilhelm Mannhardt, Mythologische Forschungen aus dem Nachlass, Quellen und Forschungen zur Sprach- und Kulturgeschichte der germanischen Völker, Strassburg 1884, vol 51 “Germanische Mythen”, Berlin 1858 ........................................................................................................................... .·.·'¯`·.·.(¯`·._.·[www.carnaxe.com.br/historia/hist1.htm]·._.·'¯).·.·'¯`·.·.